Meios de contraste em RM, a alta relaxatividade e o futuro próximo

Meios de contraste em RM, a alta relaxatividade e o futuro próximo

 

 

Inovação, fazer daquela medicina visionária a realidade, ter os olhos no futuro, trabalhar com uma medicina ainda mais precisa, com soluções customizadas, aumentando a segurança e a satisfação para usuários de produtos (equipamentos, medicamentos e meios de contraste) e para os pacientes é o que todos almejamos.

 

As boas práticas na utilização de meios de contraste, principalmente quanto ao uso correto e seguro dos contrastes à base de gadolínio (Gd) para exames de ressonância magnética (RM) foi, com certeza, nesses últimos anos, o ponto de maior discussão, gerador de muitas publicações e inúmeras revisões de guidelines e normativas regulatórias.

 

Agências reguladoras mudaram seus pareceres sobre alguns dos meios de contraste paramagnéticos disponíveis em seus mercados, restringindo utilizações e até mesmo cancelando o registro de alguns produtos em suas áreas geográficas de atuação. A EMA-European Medicines Agency (antiga EMEA) agiu de forma mais radical ao proibir em seus territórios no final de 2017 a utilização dos meios de contraste gadodiamida (Omniscan), gadoversetamida (Optimark) e o primeiro a ser registrado mundialmente, o gadopentetato de dimeglumina (Magnevist). Esta foi considerada uma medida preventiva, visto que esses meios de contraste lineares eram/são considerados de maior risco para o surgimento da FSN-Fibrose Sistêmica Nefrogênica. Poucos foram os países fora da EU-União Europeia, como o Reino Unido, Suíça e Turquia, que seguiram essa restrição mais dura. A agência reguladora dos Estados Unidos, FDA, assim como a ANVISA no Brasil, consideraram não fazer uma restrição a esses produtos e apenas foi solicitada uma nota técnica de segurança para a bula dos meios de contraste à base de Gd.

 

As diretrizes internacionais do ACR-Colégio Americano de Radiologia e da ESUR-Sociedade Europeia de Urorradiologia, provavelmente as mais aceitas à nível mundial, apesar de algumas pequenas não concordâncias entre as suas publicações periódicas, ditam orientações e a melhor prática de uso dos meios de contraste e guiam, desta forma, o mindset dos usuários de meios de contraste pelo mundo.

 

O ACR classifica no grupo 2, grupo de menor risco para a FSN, os meios de contraste macrocíclicos: gadoteridol (ProHance), ácido gadotérico (Dotarem) e gadobutrol (Gadovist), juntamente com o gadobenato de dimeglumina (MultiHance), por alguns autores classificado como “linear substituído”, visto a substituição de uma hidroxila na sua formulação por um anel benzênico ou anel aromático, o que traz maior estabilidade para a sua molécula e nenhum registro de casos não confundidos de FSN com a utilização deste produto.

 

Dadas às preocupações levantadas durante as últimas duas décadas pela associação dos meios de contraste à base de gadolínio (em inglês chamados de GBCAsGadolinium-based contrast agents) com a FSN e, mais recentemente, com a retenção de Gd no cérebro e outros tecidos corporais, pesquisadores e fabricantes têm desenvolvido alternativas para os GBCAs que tem sido comercializados desde 1987. Um caminho bastante procurado em ambientes acadêmicos, tem sido desenvolver e/ou avaliar meios de contraste de RM que não contenham gadolínio.

 

Fazendo uso de um produto de óxido de ferro superparamagnético (SPIO), o ferumoxitol, que é comercializado para tratar a deficiência de ferro, vários pesquisadores clínicos obtiveram uma excelente contrastação vascular em procedimentos de RM cardiovascular, especialmente no Massachusetts General Hospital, em Boston, que relatou o desenvolvimento químico e pré-clínico de um composto estável à base de manganês, embora com baixa relaxatividade (do inglês “relaxivity”). Vários pesquisadores têm trabalhando para desenvolver outros agentes à base de manganês e ferro.

 

Os fabricantes de meios de contraste têm se concentrado principalmente no desenvolvimento de novos GBCAs que sejam macrocíclicos e de alta relaxatividade. A alta relaxatividade em exames de RM é o grande diferencial dos meios de contraste à base de gadolínio, diferentemente dos meios de contraste iodados, onde, alí sim, a mais alta concentração é o fator de produção de maior contrastação nos exames de imagem, p.ex., na TC.

Temos hoje no mercado mundial dois meios de contraste à base de gadolínio que têm uma relaxatividade mais alta que os demais, um deles é a molécula com aprovação apenas para exames hepáticos, o gadoxetato dissódico (Primovist), de 0,25 mmol e o outro, com uma maior gama de indicações que é o gadobenato de dimeglumina (MultiHance), de 0,5 mmol. A mais alta relaxatividade em RM traz maior conspicuidade diagnóstica e a possibilidade de melhor caracterização de lesões nas imagens ponderadas em T1, portanto, os fabricantes correm atrás, no momento atual, de produzirem meios de contraste com mais alta relaxatividade para serem mais competitivos em RM.

Um fabricante francês concluiu os ensaios clínicos de fase III com o gadopiclenol, um complexo à base de Gd com cadeias laterais ricas em hidroxila, sem ligação com proteínas; esse produto poderá estar disponível nos mercados mundiais à partir do final de 2023 ou início de 2024. Com base em listas de registros de ensaios clínicos em todo o mundo, pelo menos outros dois fabricantes de meios de contraste, uma indústria farmacêutica de meios de contraste italiana e uma alemã, têm agentes macrocíclicos de alta relaxatividade em estágios iniciais de desenvolvimento clínico; a informação disponível sobre estes meios de contraste é limitada, uma vez que nenhum dos fabricantes publicou ainda quaisquer resultados de estudos laboratoriais, pré-clínicos ou clínicos para seus novos produtos. Acreditamos então, que esses novos meios de contraste para RM, ainda mais eficazes e seguros, devido à sua mais alta relaxatividade e alta estabilidade, provavelmente estejam disponíveis em todos os mercados à partir de 2024/2025.

 

Percebemos que o futuro próximo da nossa radiologia, já mais interconectada e personalizada do que nunca, está caminhando para garantir uma maior excelência no diagnóstico por imagem, inclusive com o auxílio da Inteligência Artificial que poderá fazer uma grande diferença na realidade dos médicos radiologistas ainda nessa década.

 

Depois de mais de 30 anos trabalhando com a radiologia e diagnóstico por imagem, tendo utilizado praticamente todos os meios de contraste que já circularam nesse planeta e falando, e estudando, sobre meios de contraste diariamente, eu me sinto confiante para dizer a você: “estude as diretrizes e os livros-texto, use o seu bom senso e tenha tranquilidade na utilização dos meios de contraste, são substâncias com componentes seguros e que foram e continuam sendo estudadas exaustivamente”; meios de contraste iodados como os não-iônicos hipoosmolares que utilizamos em nossa prática diária estão disponíveis no mercado há aproximadamente 40 anos e os meios de contraste à base de gadolínio também já estão em utilização desde o final dos anos 1980, ou seja há 30 e tantos anos. Nenhuma outra medicação é injetada no corpo humano com tais volumes e nessa velocidade de injeção, portanto, estamos trabalhando com produtos bastante seguros e eficientes, e, quando temos conhecimento das peculiaridades e características de cada um desses meios de contraste e seguimos as suas boas práticas de utilização, podemos ter a certeza que estamos trazendo o melhor risco-benefício para os nossos pacientes em diferentes estudos de imagens, eventos, circunstâncias e situações.

 

Dr. Fernando Poralla

Doutor em Medicina pela Universidade de Saarland, Alemanha

Diretor de Serviços Médicos e Assuntos Regulatórios para a Bracco América Latina

Membro do Grupo de Estudos de Meios de Contraste da SPR

 

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