Novo anticorpo dimunui carga do vírus HIV no sangue

Um anticorpo desenvolvido pelo grupo do imunologista brasileiro Michel Nussenzweig, do Laboratório de Imunologia Molecular da Universidade Rockefeller, em Nova York, nos Estados Unidos, mostrou-se eficaz ao diminuir a carga do vírus HIV, causador da Aids, no sangue de pessoas infectadas.

Em um estudo publicado no dia 16 de janeiro, na revista Nature Medicine, os pesquisadores relatam terem conseguido reduzir o número de cópias do HIV ao administrarem apenas uma dose de um anticorpo chamado 10-1074. É a primeira vez que esse anticorpo foi testado em seres humanos. Segundo o grupo liderado por Nussenzweig, os resultados ampliam as perspectivas de se obter uma nova classe de drogas com diferentes mecanismos de ação contra o HIV, enquanto não há vacina disponível.

O anticorpo 10-1074 pertence a uma geração de anticorpos que têm se mostrado eficazes no combate a uma grande variedade de cepas do HIV. Mais potentes do que os habituais, esses anticorpos são produzidos naturalmente por alguns pacientes e, em seguida, clonados e reproduzidos em laboratório.

anticorpo

Há algum tempo a equipe de Nussenzweig trabalha na obtenção de um conjunto de anticorpos capazes de atacar regiões do vírus vulneráveis à ação de células do sistema de defesa do organismo humano. A ideia é fazer um uso combinado desses diferentes tipos de proteínas do soro sanguíneo com antirretrovirais convencionais para tratar pessoas infectadas com HIV.

Em um estudo publicado em 2015 na revista Nature, a equipe de Nussenzweig descreveu resultados promissores envolvendo outro tipo de anticorpo (http://revistapesquisa.fapesp.br/2015/04/11/em-busca-da-vacina-contra-o-hiv/), o 3BNC117. À época eles verificaram que o anticorpo reconhecia uma região específica do vírus, impedindo-o de se conectar a uma proteína da superfície dos linfócitos T do tipo CD4 e invadir essas células do sistema de defesa do organismo. O anticorpo 3BNC117 bloqueou a ação de 195 das 237 cepas testadas, mesmo quando administrado em pequenas quantidades.

O anticorpo 10-1074 descrito no estudo da Nature Medicine é mais potente do que o 3BNC117 —doses mais baixas são suficientes para que ele exerça atividade antiviral. No entanto, tem atividade contra um número menor de variedades do vírus. “As cepas resistentes ao 10-1074 não são resistentes ao 3BNC117”, explica a imunologista brasileira Marina Caskey, integrante da equipe de Nussenzweig e uma das autoras do artigo. “Esse dado é importante porque reforça a ideia de que o uso combinado de diferentes anticorpos pode ser mais efetivo do que o uso isolado de apenas um deles.”

O 10-1074 foi descoberto pelo pesquisador Hugo Mouquet, agora no Instituto Pasteur de Paris, na França. No estudo, os pesquisadores multiplicaram o anticorpo, administraram pequenas doses em 14 indivíduos não infectados e em outros 19 infectados com HIV-1 (subtipo mais comum e agressivo do vírus) por meio de uma única injeção intravenosa. Os pesquisadores monitoraram os níveis de anticorpos e a carga viral do HIV no sangue dos participantes ao longo de seis meses.

Verificaram que, no organismo, o 10-1074 se liga a uma região específica da superfície do vírus chamada V3 loop. O anticorpo mostrou-se seguro e bem tolerado por todos os participantes da experiência. Eles também observaram que o 10-1074 diminuiu e manteve sob controle, bastante baixa, a carga viral do HIV por até seis semanas.

A cada ano, o vírus infecta cerca de 3 milhões de pessoas no mundo, segundo os especialistas no assunto. Ao todo, estima-se que 37 milhões de pessoas não sabem que vivem com o vírus e 18 milhões não têm acesso a tratamento. No Brasil, apesar de a distribuição dos medicamentos antivirais ser gratuita por meio do sistema público de saúde, o número de casos novos Aids voltou a crescer, passando de 43 mil em 2010 para 44 mil em 2015.

Os pesquisadores já iniciaram os testes envolvendo a ação combinada dos dois anticorpos e pretendem testar modificações desses mesmos anticorpos que prolongam a atividade antiviral por até quatro vezes mais tempo do que os anticorpos originais. “Acreditamos que, juntos, eles serão capazes de manter sua atividade durante vários meses, o que poderia potencialmente permitir sua administração a cada quatro ou seis meses”, explica Marina.

Fonte: FAPESP